Páginas

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

2016

2016 tem sido intenso. não consigo achar outra palavra. são 37 dias de ano, mas meu 2016 começou antes, no dia 4 de dezembro. quando eu empacotei a vida lá no apartamento treze e trouxe aqui pro vinte e três. pra morar junto e dividir a vida com o menino de olhos rasgados. a casa é gigante e entra luz por cada fresta. tivemos que cobrir o sofá para que o sol não estragasse até que cheguem as cortinas. não tem armários e as coisas estão empilhadas. foram semanas até descobrir exatamente do que precisaríamos, fazer os rabiscos, orçar, escolher. é tudo tão adulto. projeto pra tudo. o menino de olhos rasgados tem uma menina de olhos rasgados. onze anos. quase doze. desde que nos conhecemos, eu e a menina, ela cresceu diante dos meus olhos. ela suga cada fiapo de energia que eu tenho nos finais de semana a cada quinze dias. ela me lembra muito muito a menina de onze anos que um dia eu fui.

há dezesseis dias teve uma festa no trabalho. comemoração de 1 ano da lojinha. lojinha que eu sou a dona, como brinca o menino diretor (esses dias é todo mundo menino). teve bolo, e balões, e festa. eu vinha tendo (mais um) dia difícil, equilibrando mais tarefas do que eu consigo. quando começaram a cantar, eu desabei. consegui manter a poker face por dois segundos, tempo suficiente pra caminhar lentamente (e sem ninguém perceber o drama) até o banheiro. me tranquei numa cabine e chorei uns quinze minutos. sem parar. eu estava cansada, frustrada, me sentindo invisível diante de toda a comemoração. a lojinha está de pé muito por causa do meus esforço (não só meu), das minhas horas extras, das madrugadas em que sou eu a apagar as luzes e ouvir um bom dia do moço da portaria quando eu me despeço com um boa noite. eu me sobrecarrego. chego em casa e está tudo ainda precisando de ajustes. sento no sofá com meu menino, trocamos meia duzia de palavras e desabamos os dois.

teve viagem pro interior no ano novo, teve viagem pra buenos aires no carnaval. ta tendo esgotamento mental. ta tendo uma gripe que chegou hoje, possivelmente vinda da enteada que passou o fim de semana com a gente. meu menino viajou hoje. dez dias longe, no meio da neve, fazendo o que ele mais gosta. tinha essa parte de mim que queria que ele fosse, que ia achar tempo pros seriados e pros amigos. saí do trabalho às 22h. a casa é grande demais, e eu ainda não me acostumei com os barulhos. o quarto gigante. queria ele aqui. a vida anda tão perfeita, tudo está tão certo, tudo o que eu sempre quis tão aqui. eu fico com medo de alguma coisa sair errado. a gente se despediu com tanto amor, e eu só pensava que podia ser a última vez. porque parece tão óbvio que essa felicidade toda é temporária. tento distrair os pensamentos. como bolo. vejo seriado.

ele me pede em casamento quase todos os dias. todas meio brincando, meio sério. eu sei que ele quer. eu quero, mas tenho medo. fico pensando no futuro e em toda a vida que eu me ocupei planejando, e o quanto esse negócio de planejar é feito pra dar errado. há um ano eu estava em paris com o coração partido. enterrando o casamento e os dois filhos que eu teria tido no plano a. o plano b me deu uma filha emprestada. estávamos no supermercado nós duas e enquanto eu escolhia tomates, me dei conta de que era adulta. responsável por ela não sair do meu campo de visão, comprando ingredientes para o jantar. no plano b eu não sei se quero ter filhos. penso na responsabilidade, em tudo o que atropela a gente quando a gente deixa de ser a nossa principal prioridade. no último ano eu descobri que eu sobrevivo, que eu cuido de mim. não sei se dou conta de cuidar de outra pessoa. de garantir que ela sobreviva sem grandes estragos. eu sobrevivi com alguns grandes estragos.

a vidente me disse que eu tinha encontrado o meu par para a vida. isso tinha o que, três semanas desde o primeiro beijo. quando eu voltei lá sem saber se devíamos morar juntos, ela me disse. medo de que? me disse que teríamos um filho, me disse até o nome. disse que o menininho andava comigo, esperando a hora de vir. vez por outra eu olho pro espaço invisível ao meu lado e digo. pedro, espera. ainda não é agora. talvez não seja nem depois. ele está num avião agora, e a última mensagem antes de decolar foi um novo pedido. virou piada entre a gente. eu disse que estamos num bingo, e que já já ele completa a cartela. eu sei que ele fala sério. quando a gente se conheceu, ele me disse que jamais se casaria, ou moraria junto novamente. os estragos anteriores. ele chorou quando disse que queria que a gente fosse morar junto. chorou de novo esses dias, sem motivo. disse que nunca na vida pensou que iria querer se casar. eu quis tanto casar antes de conhece-lo. não achei que aconteceria algo assim no plano b. mas não. cada vez que ele fala brincando, cada vez que ele me pede, eu aceito.