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terça-feira, 26 de março de 2013

ainda sobre março

eu me lembro da minha entrevista com o chefo. ele me perguntou como eu via essa questão de trabalhar em ambientes masculinos. eu sempre trabalhei com equipes de tecnologia, e esses ambientes são essencialmente masculinos. tem uma menina ou outra, mas é sempre raro. eu sempre trabalhei com homens, e sinceramente sempre me senti muito confortável em ambientes assim. eu viro brother rapidinho. foi isso que eu respondi, na entrevista. 


viro mesmo. minha analista tem essa explicação para alguns comportamentos de algumas mulheres no trabalho. mulheres fálicas, ela diz. eu falo firme, brinco de igual pra igual. não raras vezes assisto os mesmos programas. nunca fui assediada, nunca fui amedrontada, nada disso. sempre trabalhei muito bem com meninos. 

wonderland era um ambiente machista. dava pra perceber como os caras se referiam às meninas, muitas das vezes de um jeito grosseiro.  a firma nova tem alguma coisa a ver com wonderland, no sentido de ser uma empresa muito tradicional. a divisão em que eu trabalho vem ensaiando um spin off, justamente pra ter mais liberdade nas decisões. tem menina pra caramba, apesar de todos os cargos maiores estarem nas mãos de homens. basicamente as meninas ocupam posições em conteúdo, área comercial, marketing. na minha área, tem mais homens. é meio que o meu trabalho organizar uma parte do trabalho deles, trabalhar em conjunto. acho que foi por isso a pergunta do chefo. acho que ele teve medo de que eu fosse ficar frágil diante de alguma adversidade.

bring it on, foi o que eu disse. fui criada pra não esperar nenhum tratamento especial por ser mulher. nem pra mais e principalmente não pra menos. e aí eu tava tratando com a equipe gringa que desenvolve o projeto, e o cara que é meu contato de lá estava contrariado com algumas das decisões que tomamos por aqui. e deu-se a reunião bizarra em que eu fui metida nos últimos meses. ele parecia um professor me sabatinando. EM INGLÊS. eu fiquei puta, mas não deixei transparecer. toda vez que eu achava que ele estava passando do ponto, eu perguntava. o que vc espera que eu responda? e argumentava. o meu ponto é que eu fiquei com uma pulga atrás da orelha. eu acho que ele cresceu pra cima de mim porque eu sou mulher. eu não respondi em igualdade porque não costumo ser mal educada. eu podia, mas não respondi. 

primeiro, porque demorei pra acreditar que o maluco estava realmente indo por aquele caminho. fiquei meio chocada, sei lá. segundo, porque eu estava sendo porta-voz dos chefões, e achei que não seria adequado, que poderia estar ultrapassando um limite (na minha empresa) fazendo isso. terceiro porque tem a barreira do idioma, que me colocou em desvantagem. você quer argumentar e as palavras exatas não vêm. seu discurso perde força. meu inglês é bom, mas eu tive vontade de jogar na cara dele que eu já estava fazendo DEMAIS em falar no idioma dele. e que ele era bem vindo em tentar trazer a discussão para a minha zona de conforto. uma enorme gentileza, isso de eu falar em inglês com meus fornecedores.

desde essa semana lá no comecinho de março, minha vida não ficou fácil. fiquei no meio do fogo cruzado entre os gringos e os chefos, tentando acompanhar o desenrolar da bagunça e tentando não ser bode expiatório. porque é briga de gente grande. e eu era só o mensageiro. capa da invisibilidade do harry potter.

o mês seguiu assim, até eu voltar da cidade siderúrgica depois de dois dias fora. e ser chamada na sala do chefo para um feedback.

calma aê. desde wonderland que essa palavra me traz calafrios. dessa vez foi diferente. o chefo parece dessas pessoas que têm dificuldades em dar feedback (sou igual, né?), e deu mil voltas. e eu esperando alguma crítica daquelas horriveis, e tentando tranquilizá-lo, dizendo pode falar, eu aguento, e coisa e tal.
basicamente ele disse que eu estava passando uma imagem de insegurança. e que eu estava fazendo mais perguntas do que dando respostas. e que eles (chefo e chefão) queriam me ver dando mais respostas, metendo o pé na porta.

metendo.o.pé.na.porta.

isso.

ele continuou. esse produto é seu, ele disse. diga o que você quer dele. brigue, reclame, vá pra cima dos gringos, você tem permissão e proteção pra isso. eu vinha me desdobrando pra dizer o que eu queria, mas pra estar sempre alinhada com o que o chefo queria, considerando o produto dele. e agora o produto é meu. um site inteirinho pra eu opinar, dizer o que não gosto, e dizer quando está bom e as pessoas podem parar de trabalhar.

desde então, eu tenho tocado o terror nos gringos. ainda não teve consequencias porque o asshole nervosinho tirou uma semana de férias (todo mundo resolveu tirar férias no meio do projeto, isso mesmo. dane-se os prazos) e não viu as minhas anotações em cima do layout que ele gosta ainda. estamos esperando as réplicas para esta semana, a última desse mês xexelento.

o mais legal é que cada layout tem um botão de "approve" com um coração que fica laranja sempre que uma tela é aprovada. e eles não têm telas aprovadas até agora. e quem aprova as telas sou eu. então, gringo pode chorar, gringo pode xingar. até que as coisas estejam do MEU jeito, nada de aprovação pra eles.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Março

É tanto acontecimento, e março nem acabou ainda.

Mudaram o prazo do projeto pra antes, o que sobrecarregou todo mundo, e a mim também. Eu me meti a tomar um termogênico pra ficar magra e fiquei foi louca, com crises de ansiedade. Já parei. O prazo alterado do projeto acirrou os ânimos, e triplicou as reuniões com portas (e caras) fechadas. Todo mundo resolveu duvidar das decisões que haviam sido tomadas, desde como o projeto vai se chamar até como ele vai parecer. Bem, isso é o meu trabalho, e eu não estive em todas as reuniões. Venho vivendo no susto, sabendo de coisas importantes em cima da hora, e tomando as decisões (que eu consigo tomar) sem qualquer planejamento. Peguei um avião em Porto Alegre e estava feliz da vida porque estaria em casa numa sexta feira as 16h. Congonhas fechou sem previsão pra abrir, Guarulhos fechou e fomos mandados pra Ribeirão Preto. Vi plantações de cana do alto, e isso quase que foi o ponto alto do dia. Voltamos pra Congonhas já de noite e eu peguei trânsito pela primeira vez em São Paulo. 1h30 parada na 23 de maio. Quando finalmente estava virando a esquina de casa dentro do taxi, exausta e querendo deitar em posição fetal, o telefone toca. Minha avó na UTI.

Nasceu o bebê do chefão, e ele tirou 15 dias de férias. 15 fucking dias dentro de 2 meses de prazo é 1/4 do tempo, porque esta conta especificamente eu sei fazer muito bem. Danem-se os prazos. Já não fosse ruim o suficiente, eu fiquei indo pra cidade siderúrgica direto pra ver a minha avó. Que permaneceu morrendo durante quase duas semanas. Eu voltava pra São Paulo, fazia calls com gringos nervosinhos e grossos (pressão, trabalhamos em diferentes países), pulava o almoço, mais reuniões e bombas explodindo por todos os lados. E eu pensava que enquanto eu fazia isso tudo, minha avó sofria para puxar o ar, inconsciente. Morrendo. Pulei almoços, viajei pra Porto Alegre mais um pouco, voltei, continuei tendo dias aborrecidos.

Minha avó morreu na terça-feira pela manhã. Desmarquei viagem, tirei dois dias e fui pra lá. Eu me despedi no final de semana, disse a ela tudo o que eu gostaria. Ela abriu os olhos em deteminado momento e eu juro que ouvi ela dizer "amo". Talvez seja só a minha cabeça, talvez seja o que eu queria, de fato, que ela conseguisse me dizer, mas eu já sabia, ela nem precisava. Ela cuidou de nós quando éramos pequenos, enquanto meus pais trabalhavam. Fez cada um dos meus coques do ballet, enchia a minha cabeça de spray sempre que eu queria uma trança mais firme, ou maria-chiquinha para ir pra escola. Coisa difícil isso de se despedir. Ela foi enterrada embaixo de uma árvore, junto do meu avô, e eu fiquei pensando que devia voltar lá e plantar uma mangueira pra eles. Como meu avô me ensinou, secando a semente antes de plantar. Minha mãe disse que não pode, porque o cemitério tem paisagista, e eles iriam arrancar a muda assim que começasse a crescer. Voltamos pra São Paulo na correria, com namorado correndo para o trabalho em seguida. Fui pra casa e chorei.

Estou fazendo terapia 2x por semana, tem sido assim desde que março começou. Março não acabou ainda, as discussões continuam em horário comercial, reunião atrás de reunião. Tenho me preocupado em sobreviver. Dormir, comer, trabalhar. Ir pra casa ao final do dia e deitar no colo do meu menino, quietinha.

Voltei pro trabalho e o cara de tecnologia me diz que vai tirar férias. Fucking férias, daqui a 15 dias, ainda dentro daquele prazo irrevogável com o qual estamos TODOS lidando. Eu suspiro. As pessoas são adultas e tomam as próprias decisões. Não cabe a mim carregar o peso do mundo nas costas. Não é meu papel.

Faltam 10 dias.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Porque a Susan Miller avisou que março ia ser pesado. Mas ó. Tou dando conta não.

Eu preciso que março acabe pra voltar a escrever. E a pensar.